quarta-feira, dezembro 16

Vestígios

É a chaga
Que marca
Me machuca
Dói

O chicote que estrala
Nas palavras engasgadas
Em cada golada de lágrimas

É o grito
O sopro no vazio
Que corrói

Afasta, acelera, palpita
De um passado
No presente
Em sequela

Raquel García

terça-feira, outubro 27

Incuti em Kuti

Arte de Bruno Gabiru: facebook.com/gabiru.negrart

Travessia atlântica
De lá, 
Fela
Ondas sonoras
Feito mar inquieto
Nos toca
Movimento
Dança diaspórica

Raquel García

terça-feira, outubro 20

Dia

Gosto do dia
Do clima
Da brisa
Das alterações das cores
Do céu em degradê
Do suor
De pisar em solo quente
De me refletir nas frestas
Dos raios solares em festa
Me anuncia
O olho no olho
Sem fuga
Vejo reflexos
Pessoas sinuosas
Insinuantes
Peles expostas
Timidez
Entrecostas
O dia é o brilho desmontado
Um palco ornamentado
De olhares estrelados

Raquel García

quarta-feira, outubro 14

Sossego

Quero enroscar minhas tranças em seu crespo
Lançar em cheio meu desespero
Nas marés em que me leva
Traço suas curvas
Me jogo
Me molho
Me refresco
Nesse corpo driblo ondas e adormeço
Saiba que teu amor me trás sossego

Raquel García

terça-feira, agosto 18

Olhos fotografia

Arte de Bruno Gabiru: facebook.com/gabiru.negrart

Te registrei
Nos meus olhos negros

Na face estampei
Aquilo que na alma habita

Tua aurora, fitei
Incerta, no acerto

No teu olhar, transitei
Sob a pele ainda marcada

Em mim, guardei
Parte de histórias

Pra te encontrar eu sei
No descansar do olhar

Só pra ver
A sinestesia que seu reflexo me trás

Raquel García.

sábado, julho 25

Rompimento

Somos aquilo que o racismo não quis
Na construção da identidade
Não há diáspora sem ancestralidade

Olhemos para trás como pássaro sankofa
Rompimento dos ciclos
Feito invasor
Nas suas estruturas vamos nos impor

Somos aquilo que o racismo não quis
Nossas reparações queremos em cotas
Pigmentaremos colarinhos
Com papel, caneta e memórias
Nas  instituições vamos recontar a História

Raquel García

sexta-feira, julho 10

Mergulho

Manifesta na mente o que sou
Festa em mim ecoou

Ludibriando meus medos
Encaro os anseios

Trançando outros percursos
Desimpedida de discursos

Sigo em frente de cara lavada
Pele, corpo, alma
Tão agitada quanto calma

No que pintar
Sedenta, armada, aflorada
Vou mergulhar

Raquel García

Entre o trem e a plataforma

Linhas coloridas recheadas de nós
Na concretude rotineira
Um tumulto, todo  mundo só
Braços para o alto
Bolsas na manha de colete à prova de balas
Um passa-passa
Pernas e malas
Balde(ações),
Vãos, tropeços, pessoas vãs
Quilometragem longínqua
Intensas manhãs
Todo dia, todo dia que nunca é santo
É rotina!
Eu, só para retomar os pensamentos que são prensados na "hora do rush".
Raquel García.

Achados não perdidos - 2012

Das sequências resgatadas

Exílio do corpo
Silêncio para os lábios
A astúcia da essência
Solidão necessária
Intensidade de ser
Por vezes doloridas
Cortinas abertas
Um convite
Que o sol faça sua visita diária
Para os olhos: Verdade
Abençoada seja a maldita da carne, viva!
A loucura é o processo de transmutação
E que cada tropeço meu, resista!
Pra frente e firme.
Eu, numa manhã vertical... 
Raquel García.

Achados não perdidos - 2012

terça-feira, junho 23

Antena

Já pensou que louco
Largar mão do individual
Expandir o umbigo oco
Para as experiências do real?

Dê um jeito na antena
Sintonize a consciência
Desligue-se do Rezende e do Datena
Meta um "stand by"
Alimente as ideias
Instigue a sapiência

Raquel García.

segunda-feira, junho 22

Poder ser e é

A poesia abre portas,
Derruba sentinelas
Promove encontros
Permito expor minhas querelas

Nas palavras pulsantes
De um cérebro inquieto
Num corpo insatisfeito
A poesia é alimento

Poesia que me permite o riso
Retribui o abraço
Promove o choro
De empatia e afago

Nas folhas
Páginas
Marca-texto
Boca

Poesia é um suspiro
O levante daquilo absorvido
Desejado e desconhecido

Raquel García

segunda-feira, junho 15

Mudanças

altero estradas
com minh'alma falha
(re)aprendo acertos
de mente aberta
ideias não se calam
caminho em alvoroço
paciência nas pausas
no incerto, traço recomeço
movimentos intercalam
ao silenciamento que abala
sigo firme no meu lugar de fala
distante das mazelas
redesenho minhas estruturas
de pé, me mantenho
inquieta e ousada

Raquel García


segunda-feira, junho 8

Raíz

Filhas da diáspora
Trazem consigo
Os pés enraizados
Na terra

Cultivam a força
Todos os dias
Semeando a luta

Buscam reparações
A emancipação
N'as veias abertas
Da América Latina

Correm por Benguela
São Mahins,
Dandaras, Carolinas

Ventres de Oxum
Permitem a vida

Mães
Guerreiras
Rainhas

Afoitas
No emponderar do dia-dia

Raquel García.

O Estado Veste Cinza

o Estado veste cinza encarcerar é rotina se não prende, mata
arrancam os frutos das árvores antes mesmo de maduros feito strange fruit
a negra juventude dilacera por detrás das celas ontem, senzala hoje, fundação casa
quanto vale ou é político? matricular omodé na cadeia pra burguesia bater panela que papelão!
na tv destilam o ódio política de vingança sistema de exclusão
aplausos reacionários revoltados online senso-comum midiático dos seus privilégios não abrem mão
os movimentos em reação gritam: maioridade penal? NÃO! que maldade, na moral 31 de março, não quero mais não!
Raquel García

segunda-feira, maio 4

Azaleia

Azaléia que resiste ao frio
No espaço-tempo
Explode seu pigmento
Contraste ao cinza da cidade
Movimenta o eixo
Afirmativa às adversidades
Imponente quanto os arranha-céus
Espetáculo, ensejo
Abre pétalas
Em cores floresceu

Raquel García

terça-feira, abril 28

Eu, mulher preta

Poesia estampada na Biblioteca Temática em Direitos Humanos. CFCCT

Se manca,

Se toque
Para com esse token

Eu, mulher preta
Vou falar de mim!

Não me peça calma

Meça suas palavras
Minha oralidade é tamanha
Feito som de alfaia

Eu, mulher preta

Vou prosseguir!

Nos desvios de cada fiu-fiu
Em noites de passos acelerados
Contra a colonização mental
Várias marcas
E cicatriz

Eu, mulher preta

Que sinto o arrepio!

Nessas tensões
Não lhe devo explicações
Sobre minha fala... minhas batalhas

Eu, mulher preta

É que sei de mim!

Raquel García.

quinta-feira, março 26

Negramor


Na diáspora eu resisto
Em estado de resiliência
Finco minhas raízes
Protejo minhas folhas
Minha consciência
Minha cor
Dia e noite
No frio e calor
Resistindo às chuvas e vendavais
A cada nascer e por-do-sol
Enterro minhas dores
Renasço em flor
Colorida
Altiva
E viva
Sou negramor

Raquel García

quinta-feira, fevereiro 19

CADERNOS NEGROS 37

No dia 12 de dezembro do ano de 2014, pude ter alguns de meus escritos publicados em um livro. Com imensa gratidão, participo da coletânea de poemas afro-brasileiros "Cadernos Negros" - volume 37. Esta obra é organizada pelo QUILOMBHOJE Literatura. Cada página construída nesses trinta e sete anos significa a resistência de mentes inquietas e conscientes de sua negritude! Esse espaço permite que escritorxs negrxs possam documentar em material físico o seu emponderamento nas palavras e no exercício intelectual. Bebo da fonte desse legado!

Arte: Márcio Barbosa - Quilombhoje Literatura


quinta-feira, janeiro 29

Olha a água! (É mentira)

Mistério confuso na cidade do opressor Na terra de São Paulo não há deus precursor Seu Geraldo sempre armado Das nossas águas descuidou Enquanto balela na tv discursou Desde março na perifa Tem seca no frio e no calor As escolas já se fecharam Pois nem pra merenda uma gota sobrou Agora somos obrigados À pagar aquilo que não chegou Os fenômenos da natureza se revoltou Quero ver quem vai fazer chover Na destruição ambiental Por interesses dos doutô!

Raquel García.

segunda-feira, janeiro 5

Quero ser Zen

para Zenaide Zen, no ori!

Tranquilizar-me nos momentos que me tenho
Sob a argila que ao meu corpo camufla
Deixo a sorte do corpo à expressar
Na hora em que eu menos esperar

Divido cada detalhe de mim com a natureza
Deslizando em água de cachoeira
Manifestação  real do sentimento de pureza

Salubá! Ao vento peço licença
Para o  meu corpo dançar
No encanto da inocência
Deixo minh'alma balançar

Abaixo da luz solar
Na argila entre os dedos
Sou fera, menina
Faço um esboço do novo
Sob as águas de minas

Inspiração me alcança
Sincronizo minhas formas
Às folhagens das plantas

...Elevo-me!

O movimento sai aleatório
Sem pudor
Com amor

A verdade recai sobre mim:
- Quero ser Zen!

Raquel García.


sexta-feira, janeiro 2

Tiradentes City

Cidade Tiradentes
Contorno ao lado direito do mapa
Borda recheada de diversidade
Da São Paulo multifacetada

Exílio na selva de pedra
Longe do centro
Á alguns quilômetros do mar
Minha hospitalidade
Meu lar

Reduto plural
Falador aqui
Passa mal

Da revolta e da paixão
O lado de cá vive em ação

Coletivo ou indivíduo
Sem migué
Aqui, homem e mulher
produzem o que quer

Tem embolador
Contador de histórias
Meninxs dos muros
Fazedores de rimas
Arteiros em demasia

Feijoada da Príncipe Negro
Samba ao lado do Funk
Nostalgia Black
Não esquecendo do Rap

Pizza Quadrada
ao som do Rock e do Reggae
Pombas Urbanas
Teatro, sarau e dança

Bar da Cris e do João
Biblioteca Solano Trindade
Mc's em reação

Isso é psicoferia*
Característica evolutiva da "Tira"

Raquel García

*neologismo cunhado por Emerson Dylan.